14 de junho de 2010

Bolo Prestígio - da Bicicleta

Ela era branca. Ganhei quando morava em São Paulo.
Não vou descrever a sensação que tive ao ganhar a primeira bicicleta, simplesmente por que não me lembro. Uma monarck, ou será que era caloy? Lembro que era branca e de rodinhas. A da irmã era roxa. Igualzinha, como tudo que tínhamos, só que roxa.

Engraçado essas coisas de irmãos... Me lembro bem que tudo era sempre igual, só mudava a cor. Os óculos de sol: meu rosa, dela amarelo. Os sapatos de "festa": meu rosa, dela branco. Os vestidos de festa junina, a blusa de lã, a jaqueta de couro. Às vezes nem a cor mudava. E eu me perguntando porque que achavam que éramos gêmeas. Com os irmãos foi a mesma coisa. A diferença é que dessa vez um era branco e o outro moreno.

Voltando à bicicleta. Não sei se foi de natal, ou de aniversário, de dia das crianças, não dá pra saber. É difícil distinguir as datas de presente de criança porque em casa, o presente ou era pra um ou era pra nenhum. No aniversário de um, todo mundo ganhava presente. Se vinha dinheiro tinha que dividir, verdade. Mas ganhamos a bicicleta. E tenho poucas lembranças dela.

Lembro que foi no Quinta das Oliveiras. Depois eu passei a chamar de Quinto dos Infernos. Mas na época eu gostava de morar lá. Tinha muita criança e, como todo lugar com muita criança, muita perversidade. Atropelaram no estacionamento a rodinha da minha bicicleta. E lá andava eu, de uma roda só. Bicicleta cambeta. Decidiram tirar as rodinhas da minha bicicleta.

Se para mim é difícil lembrar sensações, eu me lembro muito bem do medo que eu estava de andar nela sem rodinha. E da vergonha, porque era a única que ainda usava. Já tinham tirado as da bicicleta roxa... Mas e se eu caísse? Na frente de todo mundo? Nunca mais ia andar de bicicleta, jurava pra mim.

Sei que tiraram as rodinhas. Não foi nem o pai, nem a mãe. Os meninos do condomínio. Os mais legais disseram que iam me segurar, que eu não ia cair.

O resto foi igual o de todo mundo. Me seguraram por um tempo e, lá estava eu, toda confiante nos que me seguravam, tagarelando sem saber que era sozinha. Olhei pra trás, ninguém. Só lá no fundo. Lá bem atrás. E eu, sete anos, sobre minha bicicleta branca, sem rodinhas.

O primeiro voo a gente nunca esquece.

A bicicleta ficou pra trás, assim como o Quinto dos Infernos e os meninos do prédio. A última lembrança que tenho dela é guardada no quarto de entulhos de uma casa que morei por muito tempo. Minha ideia era mandar restaurar e fazer dela um quadro de parede, daqueles estilosos.

Perdeu-se a ideia. Ganhou-se uma história.

2 comentários:

  1. Epa que essa história tb é minha tb! E eu lembro outros detalhes e eu que te segurei e soltei.

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  2. Me lembre de contar algumas cicatrizes sobre bicicletas que me deram várias histórias. Acho que a primeira coisa que a gente ganha (na infância) que nós dá a liberdade de optar pelo risco. De viver.

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