29 de março de 2010

Herança

As tardes de sábado são o presente que compensa o resto da semana.
Faço um esforço enorme, puxo na memória, mas não consigo me lembrar como essa história começou. Na verdade, me esqueci de partes talvez relevantes dela. Estou, provavelmente, misturando duas ou mais histórias. Só ficou o que eu vi, não por coincidencia, as melhores partes.

"Filha, o que interessa é que o homem saiu por aí me enchendo de desaforo,cheio de covardia. E isso não é muito raro pra mim não, mas vindo desse homem eu não ia ficar queto. Já falei que não ia morrer sem matar um padeiro mesmo.

E tem um preto amigo meu ali na rua debaixo, homem bom, vive trabalhando, que tem uma moto velha lá. Toda vez que eu passo por ele lá embaixo vira uma gritaria besta um pro outro 'ÊêêÊeê, seu Antônio!' ' Ôôôôô Preto!'. HAHAHA!

Então eu fui filha. Coloquei o revolver no banco e fui pra furar o peito do sem vergonha. E tava naquela tensão né, aquela expectativa enquanto eu dirigia a camionete pra casa do desgramado. De repente ' Êêêêêêêêêêêêêôôôôôôôôôô Seu Toin!".

Tomei um susto desgraçado, a camionete ia pra esquerda, ia pra direita, o coração parecia que ia arrancar o peito fora. Era o preto passando na moto velha, não é que eu não vi?

' Que que foi sei Toin, assustei o senhor dessa vez?' 'Ahhh, vai embora, outra hora nóis conversa.'

Mas eu fiquei bambo de um tanto, de um tanto, que voltei pra casa. Na hora que eu cheguei, sua tia veio toda doida perguntando se eu tinha feito mesmo 'Fiz nada, sô! Eu é que quase morro de susto!'

Pois é filha, eu vi é que eu tinha minha parte de covarde também, que a gente acha que é muito corajoso, mas que no final das contas é mais covarde ainda. E imagina agora eu ia tá encrencado com isso aí, preso até. Tem hora né filha que um amigo salva mesmo a gente...

'Eu acho que é sempre, vô. Eu acho que é sempre.' "

(Porque todo mundo constrói o seu legado.)

Absorção

Minha mente é sinestésica.
Minha imaginação fértil demais.

O que eu ouço, eu vejo.
Histórias de cafeteria, histórias que não são minhas,
Eu vejo.
Não tenho culpa por invadir outros mundos assim,
eles que chegam a mim.
As dores tem cores, os causos tem cenários.
O contador é personagem na história que conta.

O que meu olhos fitam eu não vejo.
Só vejo o que ouço.
E o que fica em minha mente,
em minha cabeça perturbada,
é só o que foi visto.

Depois disso, não me arme com um lápis e um papel.

24 de março de 2010

Devaneios da aula de Micro 3





(Fugindo um pouco do estilo do blog...)

22 de março de 2010

Muito

A idéia da morte me apavora.

Só teme perder tudo quem tem muito a perder.
Muito que vale alguma coisa.
Perder uma parte de mim é perder muito. Muito.

Eu tento viver minha vida sem pensar nisso,
Aproveito cada segundo de cada tesouro que tenho
Vivo em um presente, literal e figurado.
Mas as vezes o medo toma conta de mim.

Não há nada em mim além daqueles que amo.
Perder uma parte de mim é perder tudo.

(Desculpem pela não diversão deste...)

16 de março de 2010

Mais valia

O orgulho do trabalhador é suicídio.
Enche a boca "Trabalho desde os doze anos."
Pra quê? Pra quem?

Trabalhemos apenas para nós.

15 de março de 2010

Anagrama

Poesia é um jogo de palavras
Um jogo de sentimentos

É trecho de sentimentos palavreado.

10 de março de 2010

Quem mexeu no meu poema? (Invasão)

É inaceitável você me invadir assim.
Essas palavras deviam ter sido escritas por mim.
Quem mexeu aqui dentro pra você?

(Para aquelas palavras que não fui eu quem escreveu. Para aquelas pessoas que as escreveram no meu lugar.)

8 de março de 2010

Teatro Mágico


Deslumbrada. Acho que essa é a palavra. Estou deslumbrada.

Hoje gostaria de não dormir, para não correr o risco de tudo ficar só na memória, tão pouco confiável e tão fantasiosa. São raras as vezes em que me sinto assim.

Tenho a mania de ir a apresentações musicais sabendo (ou pelo menos querendo saber) tudo do artista em questão. Dessa vez foi diferente. Pela simples distração de não estudar o repertório alheio a tempo, não conhecia muito. E me deslumbrei. Uma das coisas mais perfeitas que já vi, encantador, cativante, saboroso.

Assisti tudo com olhos de turista, sem vício. Pela primeira vez não esperei ansiosamente pela próxima música para ver se era alguma que eu conhecia ou que mais gostava. Coincidentemente, pela primeira vez minhas costas não protestaram pelas seguidas horas em pé. Dessa vez,minha garganta também não protestou contra os gritos que ela mesma produzia. Sem vício, me deslumbrei. Talvez pelo encanto do que é novo. Não interessa.

Hoje eu gostaria de não dormir. Gostaria de saborear esse dia, sem pausa. O teatro para mim sempre foi mágico mas a magia nunca foi assim tão tangível. Visível. Agora, eles são eternamente responsáveis por mim, só enquanto eu respirar.

(Hoje= 6/3/10. Não consegui não dormir.)

4 de março de 2010

Buscando

É, sei lá
É.
Não dá pra saber

(Poema a quatro mãos e duas mentes ociosas no trabalho...)

3 de março de 2010

Entrelivros (6)

"E mais, seu amor ao animal é um amor espontâneo, não é forçado por ninguém. (...) O amor entre o homem e o cão é idílico. É um amor sem conflitos, sem cenas dramáticas, sem evolução. Em torno de Tereza e de Tomas, Karenin traça o círculo de sua vida, baseada na repetição, esperando deles a mesma coisa.
Se Karenin fosse um ser humano e não um animal, certamente já teria dito a Tereza, há muito tempo: "Escuta, não acho graça de todos os dias ter que levar um croissant na boca. Não poderia descobrir uma brincadeira diferente?" Essa frase contém toda a condenação do homem. O tempo humano não gira em círculos, mas avança em linha reta. Por isso o homem não pode ser feliz, pois a felicidade é o desejo da repetição."

(A insustentável leveza do ser, again!)

Entrelivros (5)

"O romance não é uma confissão do autor, mas uma exploração do que é a vida humana, na armadilha em que se transformou o mundo."

(A insustentável Leveza do Ser)

Entrelivros (4)

"Ela (a vida humana) é composta como uma partitura musical. O ser humano, guiado pelo sentido da beleza, transpõe o acontecimento fortuito (uma música de Beethoven, a morte numa estação) para fazer disso um tema que, em seguida, fará parte da partitura da sua vida. Voltará ao tema, repetindo-o, modificando-o, desenvolvendo-o e transpondo-o, como faz um compositor com os temas de sua sonata. (...) O homem inconscientemente compõe sua vida segundo as leis da beleza mesmo nos instantes do mais profundo desespero.
O romance não pode, portanto, ser censurado por seu fascínio pelos encontros misteriosos dos acasos (...) mas podemos com razão, censurar o homem por ser cego a esses acasos na vida quotidiana, privando assim a vida da sua dimensão de beleza."

(A Insustentável Leveza do Ser)

Entrelivros (3)

"Não existe meio de verificar qual é a boa decisão, pois não existe termo de comparação. Tudo é vivido pela primeira vez e sem preparação. Como se um ator entrasse em cena sem nunca ter ensaiado. Mas o que pode valer a vida se o primeiro ensaio da vida é a própria vida? É isso que faz com que a vida pareça sempre um esboço. (...) Tomas repete para si mesmo o provérbio alemão: einmal ist keinmal, uma vez não conta, uma vez é nunca. Não poder viver senão uma vida é como não viver nunca."

(Novamente, Milan Kundera, A insustentável Leveza do Ser.)