4 de fevereiro de 2010

Oito, oitenta

Me parece que algumas coisas na minha vida ou são oito ou oitenta.

Pior que brasileira, sou goiana. Goiana acostumada com o sol do cerrado, que não é qualquer sol. Com o vento que sopra quente, queimando o rosto. Com o céu azul, tão azul e tão ensolarado que parece que a qualquer momento vai rachar o asfalto.
Sou goiana acostumada. Criada assim. Daquelas que as vezes reclama da estação única, mas que em uma semana de oito graus em Florianópolis já anseia pelo tal vento quente.

Sempre achei que gostasse mais do frio. Qualquer vento que alivia o calor, qualquer chuva mais longa que não evapora cinco minutos depois e deixa o tempo ainda mais quente. Maio, junho sempre foram épocas realmente esperadas. Até Florianópolis.

Viajei para o sul em julho. Queria ver de novo o mar que conheci na infância em São Paulo, ver tanta água que se esquece que existe ao viver no centro do país, queria sentir algo próximo do vento gelado de Ibiúna. Aproveitei para conhecer, de verdade, o frio. Que eu achei que tanto gostava.

A menor temperatura foi oito graus. Sensação térmica de três. Vento. Sol (que não rachava o asfalto). Brisa de mar, da Praia Mole, das pedras altas que circundam a ilha,das serras magníficas, inimagináveis no planalto central, no chapadão de Goiás. A areia era fria, gostosa nos pés mas diferente da areia da Juréia. A memória infantil porém me engana muito, talvez toda areia seja assim. Mas nesse dia de oito graus, Goiânia parecia o paraíso. Ansiava pelo vento quente que vem não se sabe de onde. Amaldiçoava todo e qualquer ar condicionado. A mudança nos ares à medida que subíamos no mapa era gritante e eu descobri que gosto mais do calor.

Hoje penso. Dez meses na Áustria. Pelo que dizem, cerca de noventa dias de sol de verdade. Florianópolis é Goiânia. Ou muito mais que isso. Eu sei do que vou sentir falta. Sei por quais motivos vou chorar no avião. Goiânia é mais quente para mim. É o calor das lembranças mais vívidas, da escola, dos amigos, dos primos, tios, pai, mãe. Irmãos. É o calor mais quente.

Algumas coisas na minha vida me parecem que são oito ou oitenta. Eu não nasci brasileira de Florianópolis. Minha viagem não é para a Europa quente.Nasci goiana, de trezentos e sessenta e cinco dias de sol rachando o asfalto. Do calor mais quente, repito. O frio agora acho que me apavora.

(Hipérboles, acalmem-se. Pelo menos por enquanto.)

3 comentários:

  1. Minha irmã é a reencarnação da Cora Coralina!!!!

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  2. Como profs de redação eu dou 10! Parabéns! Continue assim! Esse seu texto ficou com lindas construções e está com as suas características! Gostei mesmo!!!



    Tia Lílian!

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  3. kkkkkkkk
    Vc já tem uma boa idéia de quem eu sou a reencarnação...

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